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“Velvet Buzzsaw” parece não encontrar o tom que seu diretor, Dan Gilroy, queria, mas traz um elenco estrelar que carrega o filme, como Jake Gyllenhaal.


Desde que estreou como diretor com o excelente O Abutre (2015), Dan Gilroy deixou uma expectativa quanto ao que sua jovem carreira como cineasta traria ao cinema. Se em seu primeiro filme o diretor propos uma sátira seca e irônica do sensacionalismo jornalístico, em Velvet Buzzsaw, estreia recente da NetflixGilroy retoma seu olhar satírico para criticar o afetado mundo da arte.

O roteiro, também assinado por Gilroy, acompanha a história do crítico de arte Morf Vandewalt (Jake Gyllenhaal), que entra em uma espiral de acontecimentos sobrenaturais após as obras de arte de um desconhecido e falecido artista alcançarem o estrelato no circuito de museus de Los Angeles. Com o reconhecimento dos trabalhos, a fama e o consequente desejo de lucrar com as obras por parte dos galeristas, alastra-se uma maldição sobre todos os principais nomes da elite da arte da cidade.

A principal virtude do longa-metragem é, justamente, a forma satírica com que o cineasta constrói sua narrativa. Já nas cenas inicias acompanhamos um evento de abertura de exposição, em que percebemos a competição existente na corrida capitalista de monetização da arte. E quando somos levados a refletir a respeito de toda a afetação existente no glamour e na suposta erudição deste segmento, percebemos como há uma hipocrisia latente em cada um dos personagens que trespassam a vida do protagonista – e nele próprio.

Assim, Gilroy combina elementos de terror slasher e sobrenatural, a doses de um humor desconjuntado pautado nos excessos das situações apresentadas, seja na afetação, futilidade ou erudição. É um roteiro que acaba entregando um resultado de tom desconjuntado, tornando o filme uma mistura de gêneros que não se assumem propriamente.

A confusão é também sentida na quantidade de personagens que transitam na trama. A superficialidade desta high society de arte é latente na construção de personagens, que são todos interpretados com cargas de excesso e afetação por um ótimo elenco estrelado. Jake Gyllenhaal é quem carrega o filme com uma atuação magnética, vivendo um personagem com falhas morais em sua vida pessoal, que também se manifestam na esfera profissional. A constante variação de um comportamento arrogante para uma atuação que gera empatia transforma o crítico em um interessante peão em um incessante jogo de poder.

Dos componentes de elenco de apoio quem é mais priorizada pelo roteiro é Zawe Ashton, que apesar do evidente esforço de criar uma personagem que aprende a crescer com as regras do jogo que está inserida, não edifica uma transformação crível – tanto nas emoções quanto no seu arco. Toni Collete e Rene Russo prendem os olhos do espectador quando estão em cena, abraçando as afetações e exageros de suas personagens, roubando a tela sempre que aparecem. Já John Malkovich e Daveed Diggs tem pouco o que fazer, participando para dar rosto e corpo à representações batidas do mundo arte: Malkovich é o artista consagrado que vive uma crise de criatividade, enquanto Diggs faz um artista contemporâneo de origens do gueto urbano.

Dentro de toda a satírica e engraçada confusão que é a narrativa, fica a sensação de que Gilroy não encontrou o tom que queria. De forma trágica, dá falta de um terror que a todo o momento se enuncia, mas que em momento algum se edifica, e na carência de uma tensão forte para o mistério construído, Velvet Buzzsaw cria para si uma aura diferente das obras assassinas de seu enredo: um constante potencial que é alcançado em discurso, mas não em forma.

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