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"Hereditário" sabe muito bem o que quer e entrega um filme de terror bem produzido, sendo facilmente uma das principais estreias do ano.

“Hereditário” sabe muito bem o que quer e entrega um filme de terror bem produzido, sendo facilmente uma das principais estreias do ano.


Nota: este texto teve colaboração de João Dicker.

 

CConsiderado pela crítica um dos filmes mais aterrorizantes filmes dos últimos anos, Hereditário (2018) estreou no Brasil em 22 de junho.  O longa é centrado na história da família de Annie Grahan (Toni Colette), uma artista especializada em miniaturas realistas que vive com seu marido e com seus dois filhos em uma confortável casa. De cara somos apresentados à dinâmica da família a partir da morte de sua avó, a mãe de Annie, que acaba se tornando o primeiro ponto de catalização de acontecimentos aterrorizantes. Assim, a narrativa do longa vai se desenvolvendo e apresentando nuances que são sustentadas na ambiguidade de que o filme, e porque não seus personagens, estão submetidos a uma história de tragédia familiar ou estão no centro de acontecimentos muito mais complexos e macabros.

Partindo desta ambiguidade, Hereditário utiliza de diversos artifícios para despertar uma constante sensação de incomodo e apreensão em seu primeiro ato, enquanto observamos a família disfuncional e com visíveis – mas não claros – problemas de relacionamentos tentar retomar a vida após a morte da avó. De seu segundo ato em diante, o longa passa a explorar cada vez mais do medo como agente no espectador, conseguindo criar situações tenebrosas sem recorrer a convenções do gênero, como a conhecida técnica do jump scare. Inova, também, por evitar usar da música para antecipar as ações assustadoras, ao mesmo tempo que traz um design de som impecável, criando sons realistas que são cirurgicamente utilizados e conjugados a um arrojado jogo de uso da imagem “fora de campo” para criar ainda mais desconforto.

O sucesso no Festival de Cinema de Sundance que acarretou um exponencial aumento na expectativa pelo longa colocou a A24, produtora do longa, mais uma vez em uma posição de conforto com seus filmes independentes no festival. Se em 2015 o estúdio alcançou prestígio com A Bruxa, em 2018 certamente terá fortes chances de concorrer a prêmios com Hereditário, pegando também a onda de bons filmes do gênero que tem sido valorizados pela crítica especializada e pela Academia, como Corra! (2017) e o recente Um Lugar Silencioso (2018), também cotado para uma possível corrida à premiações.

As diversas virtudes que o longa apresenta passam inevitavelmente pelo incrível trabalho de Ari Aster, que assina a direção e o roteiro da película. O interessante jogo de câmera que o diretor utiliza cria uma excelente relação visual e sentimental entre as casas em miniatura construídas por Annie, e a casa da família Graham, passando a impressão de que tudo que acontece ali está sendo operado por uma força maior. Aster demonstra um olhar sensível para a decupagem do roteiro, mostrando que cada plano tem um sentido e um propósito para como ser enquadrado e para como cada tomada é feita, de forma que os efeitos no espectador são amplificados pelas outras virtudes na parte técnica, especialmente a trilha sonora enervante, a edição de som pungente e a montagem disruptiva.

A sensibilidade do diretor também é vista na forma como tira o melhor de seu elenco, parando a câmera para garantir o espaço necessário para todos brilharem. Toni Colette faz uma atuação impecável, dando vida a uma personagem principal construída com cuidado e complexidade, revelando sentimentos profundos e intensos que variam dos traços de loucura, da dor profunda pela perda, do remorso e do arrependimento, até o amor e proteção. Alguns críticos afirmam que a atriz merecia uma indicação ao Oscar pelo desempenho – mas sabe-se que, na história da academia, somente 14 filmes de terror receberam indicações de seus atores. Alex Wolff demonstra uma profundidade dramática impressionante, trazendo ainda mais drama e peso para os acontecimentos que cercam a família e explodindo em desespero com os efeitos que cada um destes acontecimentos causa em seu personagem. Mesmo que com pouco tempo de tela, Milly Shapiro dá vida a uma personagem reclusa, sofrida e macabra por excelência, garantindo que sua presença continue ao longo de toda a projeção.

Tenso e angustiante, especialmente a partir do segundo ato, Hereditário tem tudo para ser realmente o filme mais assustador do ano. Apesar de se valer de algumas convenções do gênero na passagem do segundo para o terceiro ato (a premissa de uma família assombrada por forças sobrenaturais está longe de ser inédita), o diretor não exaure o frescor que sua película traz para o gênero e para o cinema, principalmente graças ao excelente uso da linguagem cinematográfica.


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