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Em sua terceira temporada, "The Boys" revela que sua temática sobre a dor vai muito além da violência física.

Em sua terceira temporada, “The Boys” revela que sua temática sobre a dor vai muito além da violência física.


Notas da redatora: contém sérios spoilers sobre a série.

 

NNão é novidade alguma para quem acompanha The Boys que sangue, tripas, socos, mortes e hematomas vão estar presentes em todos os episódios, fazendo quem assiste se sentir até desconfortável.

A trama retrata a história de um grupo de homens, chamados de “Os Garotos”, que quer acabar com as farsas e mentiras dos corruptos super-heróis patrocinados pela empresa Vought. Por mais que o enredo pareça seguir um enredo de ação, a produção foi indicada ao Emmy em 2021 como melhor série de drama.

Após dois anos de espera, a terceira temporada de The Boys estreou na Amazon Prime Video e não foi diferente no quesito mortes e violência nas cenas. Mas, dessa vez, para mostrar a dor e sua origem, a série revelou uma narrativa nova utilizando o passado e foi muito além dos efeitos especiais.

 

De lá para cá: uma narrativa tão rápida como um super!

De forma resumida, a segunda temporada fechou com a derrota de Stormfrotn (Aya Cash) e com a empresa de supers, Vought, precisando fazer um controle da imagem dos super-heróis para manter seu respeito e credibilidade. A mudança de narrativa da primeira temporada para segunda é gritante, revelando reviravoltas que os telespectadores não esperavam.

O ritmo rápido da história com a morte de personagens secundários e centrais e a aparição de outros continuou presente na terceira temporada que estreou em junho deste ano (2022).

Com a terceira parte, ficamos sabendo que foi criada uma agência do governo para reduzir os danos que os supers causam na sociedade. Assim, Billy Butcher (Karl Urban), Serge ou Frenchie (Tomer Capone) e Kimiko (Karen Fukuhara) são supervisionados nesta agência por Hughie (Jack Quaid) que busca dar uma lição em supers que abusam de seus poderes sem, necessariamente, matá-los.

 

A violência para além dos efeitos especiais

A trama segue com Maeve (Dominique McElligott) descobrindo que há uma arma anti-super e passa essa informação para Billy – insatisfeito com as regras e normas da agência. Com isso, o passado é explorado e conhecemos novos personagens, um deles, é Soldier Boy (Jensen Ackles), o “antigo ou primeiro” Homelander (Antony Starr).

Além disso, Starlight (Erin Elair Moriarty) é chamada para ser a co-capitã dos Sete, o que deixa Homelander extremamente irritado, além da popularidade dele ter caído no contexto da série, ele se vê coagido constantemente, algo que não acontecia com frequência em outras temporadas.

Por mais que a terceira temporada siga o teor de violência física que já vimos nas anteriores, e até de forma mais acentuada, desta vez a dor é mostrada também por outro ângulo.

A terceira temporada de The Boys explora o passado dos personagens de uma forma bastante orgânica em que os flashbacks não são inseridos por acaso ou de forma forçada. Isso fez com que entendêssemos não somente a trama em si como também uma nova violência: aquele em que a infância está permeada de traumas.

Tudo isso, Homelander contra a parede e uma nova forma de punir os supers, proporcionou uma nova dinâmica para o enredo, o que levou os telespectadores a conhecerem o passado e, assim, a violência simbólica por trás da física em The Boys.

Conhecemos mais a fundo o passado e o psicológico dos personagens centrais, tanto aqueles que fazem parte dos chamados “super” quanto os que fazem parte do núcleo dos “garotos”. Não é somente Homelander (ator) que é explorado mais a fundo – como já foi em outras temporadas – mas, também, Black Noir (Nathan Mitchell) , Billy Butcher e Frenchie.

 

Billy Bruto: a culpa que corrói

Billy Butcher foi o personagem mais explorado em relação a isso, conhecemos seu passado após o personagem ser atingido pelo poder de um super que coloca a pessoa em uma imersão de pesadelo para sempre, fazendo com que ela não consiga voltar a consciência sem a sua permissão e, assim, falecendo por desidratação ou fome.

Conhecemos, assim, a infância de Billy, que tivemos poucos conhecimentos em outras temporadas. Já sabíamos da relação da personagem com seu irmão, mas não tínhamos conhecimento do que de fato aconteceu. Butcher deixou seu irmão sozinho com o pai abusivo e violento, o que fez com que o irmão mais novo da personagem não suportasse a realidade na qual vivia e se suicidasse.

Billy, portanto, vive com a culpa pela morte do irmão, sentindo que não deveria ter o deixado ali com o pai. Isso, atrelado ao comportamento violento de seu pai, contribuiu para a construção da personalidade explosiva e de culpa da personagem, fazendo com que ele se transformasse no que mais temia: a sua figura paterna.

Criamos, assim, uma empatia ainda maior por Billy, ao conhecer seus traumas do passado, compreendemos suas reações no momento presente, não somente a violência física, mas seu jeito reservado e sem demonstrar emoções – está seria uma violência simbólica do personagem com ele mesmo, já que não se permite ser carinhoso, emotivo, ou algo do gênero, isso talvez devido a culpa que carrega consigo.

Billy não é um cara duro e grosso por acaso, ele carrega agora também a culpa pelo morte de Becca (Shantel VanSanten), além do suicídio de seu irmão mais novo. Tudo isso gera uma dor interna no personagem que a coloca para fora com a violência física, isso fica mais evidente quando Billy adquire poderes de forma temporária com o composto V-24.

 

Frenchie: não somos o que fomos

A chegada de Soldier Boy na série trouxe novos poderes e mudanças na série, após ele ser submetido a experimentos dos russos, a personagem consegue desenvolver uma forma de sugar o poder de seu adversário. Com isso, Kimiko acaba ficando sem poderes em um momento da temporada – e muito feliz com isso, inclusive.

Porém, a personagem percebe que culpava constantemente seus poderes por eles despertarem um lado ruim nela. Após ficar sem os poderes, Kimiko percebe que, na verdade, o composto V apenas potencializou o mal que ela já tinha por dentro e prefere voltar a ter os poderes para proteger melhor Frenchie.

Isso porque o seu amigo é sequestrado e torturado durante a trama por um gangue que se envolveu no passado, junto disso, a líder da trupa que tortura Serge revela para Kimiko e demais pessoas quem ele era, o que tinha feito e detalhes de seu sofrimento com seu pai e família.

Serge também revelou em alguns momentos da série sobre a bipolaridade de seu pai e, como isso e a violência que sofria na infância, acabou gerando nele uma certa confusão ao misturar a ideia de amor e carinho com atitudes violentas.

Isso acabou sendo muito presente nas atitudes e ações de Frenchie em sua vida, mas, com o tempo, ele acabou aprendendo que o amor não é violento. Só que antes Serge até sentia certo prazer na violência – algo revelado durante a tortura do personagem e que provém do trauma de infância envolvendo o seu pai.

Kimiko consola o amigo após a situação falando como ele não é necessariamente o passado dele e, para ela, Serge é um amigo tão próximo e íntimo que ela considera ele como a sua família, por isso, a personagem deseja voltar a ter seus poderes, para poder protegê-lo de verdade, algo que não conseguiu fazer quando ficou somente uma mortal.

 

Black Noir: vinganças do passado e as consequências do presente

Black Noir era somente um personagem misterioso que não falava, vivia com uma máscara e tinha poucas aparições em toda a primeira e segunda temporada. Porém, com a aproximação sobre o seu passado e presença de Soldier Boy, Noir acabou recebendo mais palco.

Uma aparição maior e atrelada ao arco central é algo que não acontece com The Deep (Chace Crawford), outro personagem sem desenvolvimento e que fica de lado durante a trama. Na terceira temporada, esse personagem permanece com um arco longe do central e sua história apresenta um teor meio bizarro, como nas temporadas anteriores, como se fosse uma forma de transformá-lo em um ponto cômico.

Por outro lado, o passado de Black Noir vem à tona, além de ter feito parte do grupo de supers Revanche liderados por Soldier Boy e guarda um segredo sobre a origem de Homelander, ele também arquitetou uma vingança contra o ex-parceiro de equipe, o que levou Soldier Boy a procurá-lo para se vingar.

Descobrimos que o motivo da vingança de Noir com Soldier Boy é devido ao caráter autoritário, abusivo e violento que o líder tinha com todos do grupo Revanche. Além de ser sem escrúpulos, Soldier Boy utilizava a violência com todos do grupo quando era contrariado, assim, Noir consegue incentivar todos a entrarem no plano de vingança.

O plano consistia em entregar Soldier Boy para os russos e, assim, a personagem se tornou uma espécie de cobaia por anos, o que ocasionou uma resistência dele e de seu poder que, agora, consegue “sugar” os poderes de outros super – o que acontece com Kimiko e, depois, com Maeve.

Black Noir era obrigado a esconder sua identidade por ser um homem negro, a Vought não via isso como uma boa aparência para a empresa, uma vez que o racismo nos Estados Unidos continuava forte. Junto disso, ele era constantemente violentado por Soldier Boy, o que criou uma fúria dentro dele em relação ao líder.

Todo o passado do personagem é contado de uma maneira alegórica e bastante criativa pela série, após descobrir que Soldier Boy está vivo e procurando seus antigos colegas de equipe para se vingar, Noir tira o chip da empresa de seu corpo e desaparece por boa parte da temporada.

Acompanhamos Black Noir sozinho em uma antiga lanchonete, onde ele tem “visões” de seus amigos imaginários de infância, criaturas que se parecem, inclusive, com as animações de Looney Tunes – animais falantes que se comportam como seres humanos. Durante a trama, Noir é incentivado por essas figuras a encarar seu passado e se encontrar novamente com Soldier Boy.

Porém, o que Noir não esperava era que, ao revelar para Homelander que sabia sobre sua origem (Soldier Boy é pai do atual líder dos Sete), seria morto pelo próprio Homelander e, assim, não consegue nem ao menos se encontrar com seu ex-líder.

 

Homelander: o desfecho de milhões!

Desde o começo da temporada, Homelander ou John é obrigado a assumir uma posição submissa em relação aos demais personagens, principalmente com o diretor-executivo da Vought, Stan (Giancarlo Esposito). Além disso, ele também perde Stormfront que se suicida ao longo da temporada.

Com tudo isso acontecendo, John se vê frustrado constantemente com tudo e, cansado de precisar fazer uma imagem de bom moço e salvador da pátria em frente das câmeras, ele decide colocar para fora tudo que realmente pensa durante uma entrevista na televisão.

A popularidade do personagem estava caindo devido a ligação dele com os ideais nazistas de Stormfrotn. Mas, para a surpresa de todos, após alegar na entrevista que ele era perfeito, superior aos humanos e que não daria desculpas para ninguém, ao invés do povo se rebelar contra tais falas autoritárias e egocêntricas que fogem da publicidade até então vendida pela Vought, os fãs de Homelander o enaltece.

Não foge da nossa realidade ver grupos de pessoas com ideais radicais enaltecem falas violentas e autoritárias em figuras públicas, muito pelo contrário. The Boys utilizou do terror e fanatismo que existe no mundo real para transpassar a ideia de que, mesmo sendo uma pessoa desprezível e que não se importa com o próximo, Homelander receberá a aprovação do povo.

Não é mais preciso manter a imagem de bom moço, cidadão patriota e figura protetora para Homelander já que os fãs aplaudem quando ele diz o que pensa sobre ser superior, sobre não abaixar a cabeça para ninguém e, principalmente, sobre derrotar quem o contraria. Na série, as pessoas o defendem dizendo que ele não tem medo de falar o que pensar e ser quem realmente é, ele é autêntico.

Quando a popularidade dele não é mais manchada com suas atitudes e falas questionáveis, o verdadeiro perigo de deixar Homelander vivo começa de verdade. Se antes o desespero por aprovação e aceitação o impedia de fazer o que bem entendesse, como matar até mesmo inocentes por mero prazer, agora a dinâmica muda por completo, não há limites para o antagonista.

Além disso, quando ele descobre que Soldier Boy é seu pai, Homelander deixa o telespectador em dúvida sobre a sua posição na luta que virá no último episódio: ele iria mesmo matar Soldier Boy ou tentar se unir a ele?

Sabemos que John foi criado em laboratório, ele não teve carinho na infância porque as pessoas tinham medo dele desde sempre, isso foi criando uma pessoa carente e desesperada por atenção e aceitação dos demais. Assim, ao descobrir que Soldier Boy é seu pai, Homelander deseja, também, sua aprovação.

O mais impactante da terceira temporada de The Boys foi o seu final, em que Homelander não recebe somente a aprovação por suas falas autoritárias e até mesmo ameaçadoras, como também é aplaudido por sua má conduta e atitude.

Após apresentar seu filho para os fãs em meio a uma manifestação ao seu favor, Homelander vê que alguém na multidão taca uma latinha na criança e, irritado e sem pensar duas vezes, mata a pessoa por mera vingança e prazer no meio do público. Todos ficam em silêncio por alguns minutos, mas, depois, Homelander é aplaudido por matar um inocente sem mais nem menos.

A interpretação de Antony Starr na última cena de The Boys é perfeita, o ator consegue transmitir por meio da linguagem corporal e expressão do rosto a passagem de reações de Homelander do silêncio aos aplausos: do medo pela desaprovação até a felicidade pela parabenização dos fãs.

É com essa cena que chegamos a violência simbólica mais explícita em The Boys, não é somente o fato de Homelander matar uma pessoa por simples vingança e prazer na frente das câmeras sem medo da reprovação, como também a resposta que ele recebe ao fazer isso.

Não vemos raiva e muito menos indignação, recebemos nas telas as palmas e vivas para um super-herói que mata alguém e não a salva. É com esse desfecho que The Boys prova que a aceitação, parabenização e normalização de um ato violento como o de Homelander pode ser mais violento que a própria ação em si.

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