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"La Casa de Papel" é marcante, em uma série com a certeira atmosfera do crime perfeito, atuações precisas e uma trilha sonora simbólica.

“La Casa de Papel” é marcante, em uma série com a certeira atmosfera do crime perfeito, atuações precisas e uma trilha sonora simbólica.


Imagine o crime perfeito: roubar a maior quantia possível de dinheiro, sem prejudicar a população, sem machucar ninguém, saindo impune, tendo em suas mãos a polícia, o governo e a mídia. A missão parece impossível, mas com planejamento, talvez, talvez dê certo. Reúna os melhores bandidos que você encontrar, pessoas tão cruéis, quanto inteligentes e que não tenham nada a perder. Agora tudo o que você precisa é de cinco meses de preparação em um local fora de qualquer suspeita.  Tudo pronto, agora é só entrar na Casa da Moeda e imprimir a quantia máxima de seu próprio dinheiro, num curto período de tempo,  sem gerar uma hiperinflação. Não se esqueça de planejar milimetricamente cada detalhe e prever saídas para todas as situações possíveis. O imprescindível é: sempre confiar no plano.

Bem vindo a La Casa de Papel. Originalmente, uma minissérie de drama e suspense criada por Álex Pina para o canal espanhol Antena 3. Na Espanha, os 15 episódios foram exibidos de maio a novembro de 2017. Posteriormente, a Netflix adquiriu os direitos de distribuição global e reeditou os episódios, que foram divididos em 13, na primeira temporada, que estreou no Brasil em dezembro. O restante, ou a segunda temporada, entra no catálogo em abril. Entretanto, estes episódios já estão disponíveis em algumas outras plataformas.

Utilizando de uma temática clássica da TV e do cinema de assalto, transformando tudo em algo surreal e absurdo, a trama, que conquistou os brasileiros e se tornou um dos assuntos mais comentados na internet, gira em torno de um plano mirabolante para roubar a Casa da Moeda da Espanha. Oito ladrões com nomes de cidades, Berlim (Pedro Alonso), Denver (Jaime Lorente), Helsinque (Darko Peric), Moscou (Paco Tous), Nairóbi (Alba Flores), Oslo (Roberto García), Rio (Miguel Herrán) e Tóquio (Úrsula Corberó), liderados pelo Professor (Álvaro Morte), se trancam no prédio com dezenas de reféns na esperança de realizar o maior roubo da história do país.

O plano consiste em imprimir a maior quantidade possível de notas de euro sem lastro, para que não seja rastreado, e ao final, saírem todos ilesos, como heróis da história. Enquanto isso, o Professor, que tem (quase) toda a situação sob controle, comanda tudo do lado de fora. Enquanto os bandidos estão dentro do prédio, ele negocia o sequestro com a polícia, precisamente a inspetora Raquel Murillo (Itziar Ituño), roubando algo muito mais importante que o dinheiro: tempo.

La Casa de Papel dá espaço para as personagens se desenvolverem, possibilitando a criação de um sentimento por cada uma delas, até mesmo aquelas consideradas menos importantes, como os reféns. A narrativa também se apresenta de maneira sutil, porém clara: podemos ver as relações que se desenvolvem entre as personagens, de amor e amizade, mostrando que aquele bando de criminosos pode se tornar uma família.

A ótima atuação é um dos pontos que mais chama atenção e fator principal para a conexão entre o público e as personagens. Todas têm força própria, são intensas e dotadas de personalidades intricadas. Além disso, o roteiro nos deixa com os nervos à flor da pele, sendo emocionante, repleto de reviravoltas e bem amarrado.

Um dos fatores que mais impulsionou o sucesso da série é a utilização de cliffhangers, um recurso de roteiro que na tradução significa “beira do abismo”. São mudanças na narrativa que colocam as personagens em auge de um conflito, quando tudo pode dar errado em um segundo. Metaforicamente, o roteiro está à beira desse abismo, e fisicamente o telespectador está à beira do sofá, com a respiração acelerada e mão parada na pipoca. A série é recheada de detalhes marcantes, como os olhares sedutores de Tóquio, a perspicácia de Nairóbi ou as perdas de controle de Berlim, assim como a curiosidade acerca de suas histórias e suas relações interpessoais, uma vez que é vetada a existência de vínculos sentimentais no grupo.

O detalhe mais característico e emblemático de La Casa de Papel são as máscaras. Nos momentos em que aparecem para a polícia ou para a mídia, todos os bandidos usam macacões vermelhos e cobrem o rosto com máscaras de Salvador Dalí, o pintor catalão conhecido por suas obras no estilo surrealista. O rosto, que representa o crime, resume todo o plano e a narrativa da série. Assim como nas pinturas, o crime apresentado na narrativa extrapola a lógica apenas o suficiente para assustar, mas ainda se mantém legítimo o bastante para ganhar o coração do público. Quando a identidade de alguns assaltantes é revelada, eles param de usar as máscaras, e começam a revelar um pouco de suas histórias de vida, saindo do surrealismo e fazendo deles pessoas mais reais.

Marcante é a palavra certa para descrever a trilha sonora, com músicas em espanhol, inglês, italiano e até português, do pop ao clássico. A faixas são precisamente bem colocadas, criando a atmosfera perfeita para o crime. Entre elas, a que mais se destaca é Bella Ciao (“Adeus, querida”, na tradução do italiano). A canção, símbolo da resistência italiana contra o fascismo, está presente nos momentos mais importantes da trama e se tornou o hino da produção, ficando na cabeça de vários espectadores.

La Casa de Papel recebeu diversas indicações, ganhando prêmios como Melhor Roteiro no Premios IRIS e Melhor Direção nos Premios MiM Series. Ainda que não tenha sido divulgada uma terceira temporada, ficamos ansiosos para a chegada da segunda parte na Netflix, além de boquiabertos com a genialidade dessa série, que é sucesso e já tem lugar cativo no coração dos brasileiros.


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