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Witch’s honor: 45 anos sem “A Feiticeira”

"A Feiticeira" completa quase meio século como um dos ápices da televisão, entregando uma série divertida e familiar – mas cheia de crítica.

“A Feiticeira” completa quase meio século como um dos ápices da televisão, entregando uma série divertida e familiar – mas cheia de crítica.


Elizabeth Montgomery ficou imortalizada por conta de seu papel como Samantha, e sua “torcidinha” no nariz (ideia, inclusive, que partiu dela) virou sua marca de assinatura
ÉÉ bem possível que não haja bruxa mais famosa do que Samantha Stephens, a feiticeira loira que fazia magia apenas com o mexer de seu nariz. Em A Feiticeira, ao recusar sua linhagem mágica e decidir casar-se com um mortal, a moça tenta, sem muito sucesso, adaptar-se ao mundo sem bruxaria.

Samantha é uma “garota ordinariamente comum”, que esbarra diversas vezes com Darrin, um “cara ordinariamente comum”. O estranho acaso acaba levando os dois a saírem em um encontro, no qual acabam se apaixonando e, enfim, casando. Na noite de núpcias, Samantha revela o seu grande segredo: “Darrin, eu sou uma Bruxa“. Mas não uma bruxa de expressão, por ser uma mulher chata e intrometida: ela é, literalmente, uma bruxa. De vassoura, caldeirão e magia.

 

A Feiticeira

Com esse plot um tanto original, Elizabeth Montgomery deu vida à Samantha. A Feiticeira foi ao ar pela primeira vez no dia 17 de setembro de 1964 pela ABC, reunindo uma legião de fãs e um sucesso estrondoso. A fama da produção foi tamanha que ressoou até na NBC, que correu para produzir a sua própria série de feiticeira e estreou, em 1965, Jeannie é um Gênio.

A Feiticeira resultou em oito temporadas e algumas trocas de elenco, mantendo como fixo Elizabeth e Agnes Moorehead, como a mãe de Sam, Endora. Dick York, que dava vida ao marido Darrin (traduzido no Brasil para James), veio a ser substituído na sexta temporada por Dick Sargent.

Samantha entrou voando na casa das pessoas (ba-dun-tss), virou uma febre e tornou-se um símbolo cultural. Sua influência acabou gerando homenagens em séries como Charmed, Os Simpsons, Family Guy e Os Flintstones além de ter ganhando um spin-off  e um filme de mesmo nome em 2005, estrelado por Nicole KidmanWill Ferrell. A série também serve como uma forte crítica ao sistema de estilo de vida da época, utilizando as feiticeiras como uma quebra da realidade.

 

O Enredo

Durante os oito anos no ar, Endora foi vista em todos os 254 episódios exibidos

Após a revelação da esposa, Darrin se vê dentro de um problema sem fim. O rapaz desaprova o estilo de vida da mulher, tentando, incansavelmente, fazê-la abdicar de seus “truques”, afim de viver a vida sem “hocus pocus“. No entanto, a tarefa logo mostra-se impossível para Samantha, que tenta agradar o marido mas constantemente se vê forçada a usar de sua magia em diversas situações do seu dia-a-dia. Como se os problemas não fossem suficientes, Endora vive fazendo visitas indesejadas para tentar colocar um fim ao casamento misto da filha.

O casal também recebe diversas visitas de outros membros da família de Sam, como de seu pai Maurice (Maurice Evans), que também desaprova o casamento; da Tia Clara (Marion Lorne), esquecida e atrapalhada; da prima descolada e revolucionária, Serena (Elizabeth Montgomery); e do charlatão Dr. Bombay (Bernard Fox). Os Stephens ainda contam com uma vizinha bisbilhoteira, Gladys Kravitz (Alice Pearce e Sandra Gould), e o seu marido que está “nem aí” para todo ao seu redor, Abner (George Tobias).

Enquanto Samantha passa os seus dias sendo uma dona de casa, destinada a atender todas as necessidades de seu marido, Darrin trabalha na agência de publicidade de seu grande amigo e mulherengo Larry Tate (David White), que desconhece completamente do segredo do empregado – assim como a sua esposa, Louise Tate (Irene Vernon e Kasey Rogers).

Parte do elenco recorrente, Larry Tate, o chefe de Darrin, participou de 191 episódios

Ocasionalmente, Darrin também recebe as visitas dos pais. Phyllis Stephens (Mabel Albertson) é uma mãe-coruja, extremamente carente e que vive com “dores de cabeça”, afim de chamar a atenção do marido e força-lo a fazer o que ela quer. Frank Stephens (Roy Roberts) é um homem cansado, que percebe das artimanhas da esposa, mas decide ignorar para não criar conflito.

 

Crítica Social

Embora A Feiticeira seja uma série de comédia, há uma forte crítica social embutida nas entrelinhas de sua narrativa. A mais óbvia delas está no casal Stephens. Darrin é um homem de sua época, que gosta que as coisas permaneçam sem alterações: prefere que sua mulher fique em casa, sem trabalhar, enquanto ele é o “chefe da casa”. Seus ideais logo mostram-se um resultado de sua criação, principalmente por parte de sua mãe, que também acredita que o lugar de uma mulher é em casa, cuidando do marido e fazendo de tudo para servir às suas necessidades (afinal, foi assim que ela fez).

Ao longo dos anos, Samantha foi vista várias vezes assumindo o seu visual de feiticeira, viajando com a mãe até o “outro plano”

Samantha, por outro lado, representa o completo oposto disso. Por ser uma feiticeira de três mil anos, ela viveu uma vida completamente diferente, assistindo de camarote a História acontecer. Consequentemente, a personagem acabou incorporando em si uma forte independência, assim como uma liberdade, fazendo dela uma das representações do feminismo dentro da série.

Desgarrada do mundo mundano e das obrigações do dia-a-dia, Sam nunca precisou aprender a fazer tarefas básicas destinadas às mulheres da época, como cozinhar ou lavar roupa, sempre vivendo em viagens e se hospedando no melhor que a bruxaria pode lhe oferecer. Sua vida acabou gerando-lhe bastante independência e espírito livre, sem precisar atender a ninguém – a não ser suas próprias necessidades.

É apenas quando se casa com Darrin que Samantha se vê “forçada”, ainda que por “opção”, a experimentar da vida humana. Por mais que esteja obstinada a, de fato, abdicar de sua vida como feiticeira, Samantha mantém vivo seu lado desgarrado, as vezes brigando com Darrin devido sua obsessão em fazê-la acabar com o uso de magia. A feiticeira encontra-se sempre no limite da encruzilhada entre ser humana ou continuar vivendo como uma bruxa, muitas vezes buscando balancear os dois estilos de vida.

Para ajuda-la a manter o seu lado feiticeira, está Endora. A mãe de Sam funciona como o link de sua vida anterior, estando constantemente viajando, festejando e socializando com Princesas e Príncipes, entrando cada vez mais nos círculos exclusivos dos feiticeiros. Endora desaprova o estilo de vida escolhido pela filha. Entediada com a vida mundana, ela está sempre se esforçando em mostrar o que Samantha está perdendo, ao mesmo tempo em que vive se intrometendo na vida do casal, constantemente sendo o estopim (propositalmente) para as brigas do casal. Endora, que desconhece os limites, até mesmo já transfigurou Darrin em animais ou objetos de decoração.

Endora nunca foi fã de Darrin; e em muitas situações deixou isso bastante claro

No mesmo círculo mundano de Darrin está Larry Tate, que representa tudo o que há de frívolo no sexo masculino. Larry, com seus 50 e tantos anos, acredita que ainda está na flor da idade e que o seu dinheiro significa poder e status. Mesmo com uma esposa em casa, o chefe de Darrin nunca perde a oportunidade de dar em cima de mulheres jovens e esbeltas, até mesmo, diversas vezes, deixando a ideia de que traiu Louise (mais de uma vez) – não é difícil de acreditar que, se vivo hoje, seria alvo de inúmeras denúncias de assédio. Larry também acredita que o lugar de mulher é ficar em casa, e assim como qualquer marido rico, simplesmente detesta a ideia de que sua mulher está torrando seu dinheiro nas compras, mesmo que use desta desculpa para se livrar dela e ir festejar ou viajar sem sua companheira.

Serena, a prima descolada de Samantha, era interpretada pela própria Elizabeth; considerando a época de produção, os efeitos que uniam as duas personagens em cena eram bastante aceitáveis

O último ponto crucial de crítica de A Feiticeira é Serena, a prima de Samantha. Fisicamente, as duas são quase gêmeas (afinal, Elizabeth Montgomery interpreta as duas), mas são completamente diferentes de personalidade. Enquanto Samantha é mais retraída e contida, Serena é um verdadeiro furacão. Sua alma é viva e jovem, sem nenhum senso de responsabilidade. Revolucionária, a prima de Samantha sempre está a frente de seu tempo, participando de meios da música jazz e rock ‘n roll (estilos musicais que, na época, sempre foram relacionados ou aos negros, ou aos jovens e perturbados), namorando homens de cor, participando dos movimentos hippies, lutando pelos direitos de independência da mulher.

Serena também vive em festa, e mostra-se sempre entediada com a vida mundana de sua prima. Constantemente se intromete na vida de Samantha, apenas pelo prazer de criar caos, que vê como uma deliciosa e animadora diversão. Em algumas situações já trocou de lugar com a prima pela piada, ou até mesmo chegou a ir atrás de um marido humano para “se aquietar” (sem muito sucesso). Serena é a força do novo e do inovador, do jovem, do fresco, das mudanças, do futuro.

 

Reboot?

Com o peso e o legado que a série deixou, ao terminar no dia 25 de março de 1972, não é de se espantar as vontades de se produzir um reboot. A produção chegou a ganhar um filme de mesmo nome em 2005, com Nicole Kidman na pele de Sam, mas acabou sendo muito mal recebido pela crítica, manchando a imagem de A Feiticeira.

Em “A Feiticeira” (2005), Nicole Kidman fazia Isabel Bigelow, uma bruxa escalada para fazer Samantha Stephens em um revival da série (dentro do filme) por conta da “torcida” que fazia com o nariz; genialmente original?

Desde 2011, no entanto, rumores vem e vão na indústria do entretenimento sobre uma possível nova versão da série. Em 2011, a CBS encomendou um episódio piloto, mas que nunca foi produzido. Em 2014, a Sony Pitcures vendeu um piloto para a NBC, afim de estrear a série na temporada 2015-2016. Na trama, a neta de Samantha protagonizaria a série, e também abdicando dos poderes afim de encontrar sua alma gêmea. Tanto Daphne, a neta, quanto a Sony não tiveram nenhum sucesso em suas aventuras, e o projeto permanece engavetado até hoje.

Por mais que a possibilidade de ver Samantha Stephens de volta à TV sejam menores a cada dia, A Feiticeira continua viva no imaginário de milhares de pessoas ao redor do mundo. Afinal, chega a ser impossível não conhecer o famoso mexer de nariz que Samantha fazia no momento de utilizar sua magia.


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