fbpx

“A Amiga Genial” é intensa e muito bem construída. O teor girl power vem de forma muito natural em uma série bem verossímil e comprometida com a realidade


“Fiz muitas coisas na vida, mas sem convicção. Sempre me senti distante das minhas próprias ações. A Lila, embora estivesse em movimento contínuo, pequena e nervosa, assumia as coisas que fazia. O que me impressiona, e o que eu sempre notava, era a firmeza dela. A Lila era firme”.

A Amiga Genial, inspirada no romance da italiana Elena Ferrante, chegou a HBO no final de 2018. A obra original vendeu 30 milhões de cópias no mundo inteiro e é o primeiro lançamento da tetralogia napolitana, composta também pelos livros A História do Novo Sobrenome, História de Quem Foge e de Quem Fica História da Menina Perdida. Com narrativa centrada na amizade de Elena Greco e Rafaella Cerullo, a adaptação para as telas ficou sob a responsabilidade de Saverio Costanzo, diretor romano.

https://www.youtube.com/watch?v=EfEQcmxClf4

Tudo começa  com uma ligação. O filho de Cerullo liga para Greco no meio da madrugada, perguntando se ela sabe onde sua mãe se encontra. Greco, então, é tomada por memórias. Lila sempre teve o hábito de sumir, lembra. Assim, voltamos para a década de 1950 a fim de explorar a infância das duas companheiras inseparáveis.

A reconstituição da atmosfera literária impressiona. De acordo com informações do jornal The Guardian, o designer de produção Giancarlo Basili passou uma semana em Nápoles para garantir que a realidade retratada no livro fosse transferida para a série. A familiaridade com que Ferrante descreve as localidades não poderia se perder. Dito e feito. Um senhor italiano, que viveu na Nápoles pós-guerra, foi ao set para conferir se os cenários eram verossímeis. Ainda segundo o jornal britânico, ele não só aprovou, como ficou emocionado e chorou durante a visita.

A série já começa intensa. Com uma mise-en-scène muitíssimo bem construída, o espectador consegue mergulhar na autêntica realidade napolitana. A trilha sonora e a direção de fotografia de A Amiga Genial também são acertadas e criam ambientações pertinentes (e bem cinematográficas) para os acontecimentos. Logo no primeiro capítulo, é possível conhecer as duas personagens principais e notar como são ambas são complexas e bem construídas. A narração de Elena exala literatura.

A primeira “mesada” que Elena e Rafaella recebem na vida não poderia ter sido melhor aplicada: as meninas decidem comprar um livro. E o encantamento das duas quando se deparam com as palavras impressas não poderia ser mais genuíno “Temos um balde na nossa cabeça cheio de palavras, onde há tudo que precisamos. Tiramos uma palavra, depois a outra e escrevemos um livro”, sonha Lila em voz alta, depois de sua primeira leitura.

As atuações das garotas Elisa del Genio e Ludovica Nasti impressionam. Dizer que elas roubam a cena é pouco; talvez “sequestram” seja um verbo mais adequado. Na fase adolescente,  as protagonistas são vividas por Margherita Mazzucco e Gaia Giracce, também excelentes. Os testes para o elenco, que é 100% italiano, levaram oito meses para serem concluídos e contaram com a participação de 9.000 crianças e 500 adultos. A maior parte dos atores selecionados são estreantes – apenas Gaia já teve experiência profissional.

Repleta de mistérios, a produção se torna mais envolvente a cada capítulo. Os episódios são recheados de dialetos napolitanos e até mesmo os italianos precisaram de legendas para compreender todas as falas. “A HBO queria algo autêntico. Não me impuseram nada e pude ir para onde quisesse”, afirmou Constanzo em uma coletiva do Festival de Veneza. Por romper com a lógica norte-americana, A Amiga Genial representa uma inovação. No mesmo evento, o produtor Lorenzo Mieli garantiu que, caso a série seja bem sucedida, toda a indústria mudará.

A pegada girl power da temporada é extremamente natural e, ao mesmo tempo, potente. Embora essa força feminina esteja presente desde o primeiro minuto de A Amiga Genial, para o diretor,  a narrativa é essencialmente sobre o poder da educação. “Os livros de Ferrante contam que um professor pode salvar sua vida e mudar seu destino. O conhecimento e a cultura são as únicas maneiras de construir uma alma sólida. Essa é a ideia mais política e provocadora do livro, embora esteja escondida dentro de uma história de amizade e sentimentos”, declarou.

Autora Misteriosa

Afinal de contas, quem é Elena Ferrante?

O mistério em torno da identidade da escritora italiana se tornou um atrativo a parte. Quando explodiu com A Amiga Genial, em 2011, a Itália (e, posteriormente, o mundo) queria descobrir qual era o rosto por trás de uma história tão bem sucedida. Em uma sociedade cada vez mais midiatizada, era surpreendente que Ferrante preferisse se esconder. Sem posts no Instagram, sem participação em programas de TV, sem sua cara estampada em revistas e jornais.

Intrigado, o jornalista italiano Claudio Gatti se dedicou a investigar o mistério. Chegou a uma conclusão: a escritora seria, na verdade, Anita Raja, uma tradutora da Edizione E/O, editora responsável pelos livros de Ferrante. Ele chegou a esse veredito depois de examinar a contabilidade de Raja e perceber que suas finanças tiveram um pico exorbitante na época do lançamento de A Amiga Genial. Enquanto a imprensa aplaudiu a suposta descoberta, boa parte do público declarou repúdio aos métodos invasivos do jornalista. Até hoje, no entanto, Ferrante não assumiu uma identidade.


Compartilhe

Twitter
Facebook
WhatsApp
Telegram
LinkedIn
Pocket
relacionados

outras matérias da revista

Back To Top