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"Doctor Who" é um dos maiores clássicos da televisão mundial, com mais de 50 anos de história. Em 2018, a série estreia sua primeira Doutora.

“Doctor Who” é um dos maiores clássicos da televisão mundial, com mais de 50 anos de vida. Em 2018, a série faz História e estreia a sua primeira Doutora.


NNo ano em que foi projetada, em 1965, séries de fantasia para a família não eram grande sucesso de público na grade televisiva. Ainda na incubadora, Doctor Who já foi recebida como um fracasso, e não era levada a sério pelo canal-casa, a BBC. Porém, contrário ao que todos esperavam, o programa acabou se tornando um gigantesco sucesso, não só gerando uma legião de fãs por todo o Reino Unido (e, posteriormente, fora dele), mas durando mais de 50 anos, fazendo da produção a série de maior duração da televisão mundial.

 

Doctor Who

Na narrativa, somos apresentados às aventuras de um alienígena do planeta Gallifrey. Com aparência de um humano, o extraterrestre faz parte de uma raça chamada de Senhores do Tempo. Vivendo na Terra sob o título de um professor, o Doutor, único nome no qual é conhecido (e que permanece uma incógnita até hoje), viaja numa espaço-nave pelo tempo e espaço, conhecida como TARDIS (“Tempo e Dimensão Relativas no Espaço”, em português).

A TARDIS possui um mecanismo de camuflagem, tomando a forma de algo bastante comum da época que se encontra. Na história, a TARDIS do Doctor tem esse mecanismo danificando, ficando presa na imagem de uma cabine telefônica de polícia dos anos 50. Quando questionado se “ninguém vai perceber” o inusitado objeto, o Doctor sempre afirma que os seres humanos, sempre distraídos com a própria vida, não seriam capazes de perceber a TARDIS nem se esbarrassem nela

Ao seu lado, há sempre uma companhia, conhecida como a Companion. Na primeira temporada, a personagem era a sobrinha do Doutor, mas desde então as companhias são (em grande maioria) mulheres que acabam esbarrando com o extraterreste, mergulhando nas aventuras e responsabilidades do alienígena (já houveram, no entanto, duas companions homens).

Com uma narrativa criativa, dramática e bastante cômica, o título da série, Doctor Who, faz uma piada com algo que acontece constantemente: o nome não-usual do Doutor gera um certo ruído entre as raças, que sempre estão acostumadas com a ideia de que “doutor” é um título, e não um nome. Consequentemente, sempre que o Doctor se apresenta, a pergunta logo segue: Doutor Quem?

 

50 Anos de Doutores

Ao longo de seus mais de 50 anos em exibição, Doctor Who trouxe consigo uma mitologia bastante vasta, com inimigos e amigos que sempre aparecem ao longo das temporadas, como os temíveis Daleks, arqui-inimigos declarados do Doctor. Além das personagens, a história sobre os Senhores do Tempo é, no mínimo, interessante: diferente dos seres humanos, os habitantes de Gallifrey tem dois corações. Devido a esta particularidade, Senhores do Tempo nunca morrem; eles se regeneram, ganhando, literalmente, um novo corpo.

A ideia por trás dessa curiosidade veio, na verdade, de uma necessidade. Nos rascunhos originais de Doctor Who, essa questão da regeneração nunca esteve presente na narrativa. No entanto, a série começou a fazer um gigantesco sucesso, atraindo um público cada vez maior. Na época, no entanto, William Hartnell, o ator que fez o Primeiro Doutor tinha uma saúde bastante debilitada, forçando a sua saída do programa. Como o cancelamento não era uma opção (afinal, o fluxo de caixa era muito grande), os Senhores do Tempo ganharam a habilidade, dando início a uma vida longa e próspera ao Doctor.

Todoas as treze regenerações do Doctor reunidos em uma imagem promocional do Especial de 50 anos da série

Desde então, o Doutor já passou por doze regenerações. Onze delas foram durante as temporadas seguintes da série, e uma durante um hiatus que aconteceu entre a série original e o seu revival, que na narrativa ficou conhecida como o War Doctor. Os primeiros oito Doutores estiveram na televisão até 1996: sete no programa original (em 1989, a série foi cancelada em sua 26ª temporada) e um em um telefilme (1996). Após o lançamento desta última produção, Doctor Who ficou fora do ar por nove anos, ganhando em 2005 o revival.

À época, é claro que a BBC ainda não apostava 100% que o projeto reprisaria o mesmo sucesso, resultando em um orçamento baixíssimo que ficou evidente em sua exibição. Com o retorno à tv, a explicativa para o sumiço do Doutor foi simples, porém trágica: entre os anos fora da Terra, o alienígena voltou para o seu planeta-natal, onde uma guerra se instaurou contra os Daleks. Forçado a tomar ação para terminar a guerra, o Doctor acabou causando a explosão de Gallifrey, resultando na extinção dos Senhores do Tempo e dos Daleks. Consequentemente, o personagem se tornou o último de sua espécie, fazendo com que ele ficasse marcado e amargurado por ter sido o catalizador da tragédia. Como resultado, ele voltou à Terra, vivendo em constante fuga e negação, recusando-se a comentar qualquer coisa que tivesse relação ao seu amado planeta.

A série estreou, então, com o Nono Doctor, com uma das Companions mais memoráveis da série. Desde então, foram mais outras três regenerações. Neste ano, a série chegou à sua 10ª temporada e o fim do ciclo do 12º Doutor.

 

A Polêmica

Jodie Whittaker é a primeira Doutora da história da série

Com o Twelfth se aproximando de sua regeneração (o momento acontecerá apenas no costumeiro Episódio de Natal da série, que vai ao ar no dia 25 de dezembro deste ano), a BBC realizou o muito esperado anúncio de quem será o 13º Doutor. Desde o ano passado, rumores começaram a circular pela internet, afirmando que, pela primeira vez na história da série, o novo Doctor seria uma mulher. Diversos nomes foram ligados aos rumores, mas o canal nunca chegou a confirmar (ou negar) as notícias.

Em julho, o anúncio foi feito: a 11ª temporada de Doctor Who trará uma Doctor e a inglesa Jodie Whittaker seria a mais nova pilota da TARDIS. A atriz é uma conhecida do público britânico, por ser a protagonista da série Broadchurch, que, curiosamente, também é estrelada por David Tennant, o 10º Doutor.

Por mais que as regenerações sejam sempre dolorosas para os fãs, que se apegam as novas versões dos Doctors, a presença de Jodie como a 13ª causou um maior desconforto entre as pessoas. Rapidamente, a polvorosa se instaurou. Whovians e não-whovians se separaram em dois grupos: o dos que acolheram Jodie de braços abertos, e o dos que não aceitavam a mudança de gênero do Doutor.

As redes sociais logo ficaram cheias de textões de apoio e repúdio à Doctor. Enquanto alguns relembravam os ensinamentos que o Doutor passou ao longo de seu mais de meio século, como a compaixão ao próximo e o fim ao preconceito, outros alegavam que a BBC queria perpetuar e forçar as pessoas a aceitarem a “ideologia do gênero”, afirmando que “um homem não pode virar mulher e vice-versa” (dessa última situação, muitos deixavam claro que não assistiam a série, mas mesmo assim não aceitavam que esse tipo de coisa acontecesse).

A repercussão foi tamanha que a BBC precisou emitir um comunicado reafirmando sua escolha, mostrando grande animação com os caminhos visionários que Jodie tem para a personagem.

 

Opinião Pessoal

Doctor Who apareceu na minha vida em um momento em que eu precisei dar uma freada no volume de séries que eu assistia, cortando grande parte da minha grade. Atualizado e sem muita vontade de retornar ao que foi deixado para trás, fui atrás de algo novo para assistir. Fui indicado à série, que logo comecei a assistir.

A produção de baixa qualidade não me assustou, e, muito rapidamente, me apaixonei pelo Nono Doutor, o Senhor do Tempo mais underrated da nova geração. Rose, a primeira e mais memorável Companion do revival, também roubou meu coração, fazendo com que DW se tornasse uma das minhas séries favoritas de todos os tempos.

Como uma das duplas mais cultuadas de toda a série, Tenth e Rose foram muito mais além do que a simples companhia e amizade; ao longo de seus anos juntos, eles acabaram se apaixonando, fazendo de Rose o grande amor do Doctor

Como um whovian devoto, também sempre sofro com as regenerações. Cada Doctor é particular. Fica impossível não se apaixonar por cada um deles e soltar lágrimas quando um novo Doutor assume o posto. Com o 12o, no entanto, foi diferente.

Os primeiros momentos de Peter Capaldi como Twelfth foram um baque, devido sua abordagem ser bem obscura e amargurada. Eu não fui o único que senti a estranheza, o que acabou forçando os showrunners a deixarem a personalidade do personagem de Capaldão (apelido carinho utilizado pelos whovians) mais leve nos episódios seguintes.

O amor então veio, e rapidamente tornou-se bastante difícil dizer adeus a mais um Doutor. Mas, assim como diversos outros fãs, eu estava bastante animado por ter, pela primeira vez, uma Doutora. Comecei a imaginar como seria, por exemplo, Tilda Swinton como uma Senhora do Tempo. Então, veio o anúncio de Jodie Whittaker – recebi de braços abertos, o que causou meu desconforto com a polêmica.

Vi muitos relembrando os ensinamentos de Doctor Who, e outros mostrando preconceito não só à novidade, mas também puxando para a discussão e discurso contra todas as pessoas trans do planeta. Foi no meio de tudo isso que eu parei para perceber uma coisa: ninguém parecia perceber que o acontecimento não era inédito e que um Senhor do Tempo já teria se regenerado em uma Senhora do Tempo.

Na oitava temporada, conhecemos a magnífica Missy (Michelle Gomez), regeneração do Master (John Simm). Porém, diferente do que aconteceu com o Doctor, ninguém mostrou nenhum incômodo, ninguém bateu panela, ninguém fez textão nas redes sociais. Então, porque as pessoas estava bravas agora?

Rapidamente, Missy tornou-se uma das mais divertidas e interessantes personagens. Em uma relação de amor, ódio e respeito com o Doctor, a regeneração do Master muda bastante ao longo ao longo de dois anos, muitas vezes servindo de aliada para o Senhor do Tempo

A resposta óbvia seria, é claro, por ser o Doctor. Mas isso também não fazia sentido, considerando toda a discussão de que estava sendo levantada de que “um homem não pode virar mulher”. Já tinha acontecido antes! Então porque as pessoas estavam realmente bravas?

A pergunta continuou sem uma resposta definitiva, mas a discussão estava acesa. O Doctor ser, agora, a Doctor, não muda substancialmente nada na série. A unica coisa que podemos levar em consideração é que cada regeneração é resultado de uma particularidade na vida do Doutor. Quando o Eleventh, jovem e criança, regenerou no Twelfth, velho e maduro, foi porque o Doctor havia, finalmente, encontrado uma forma de lidar com seu passado sombrio e salvar Gallifrey, e já não estava mais correndo em negação (Run, you clever boy, and remember). E assim fica a pergunta: o que será que vai fazer o Doctor mudar tanto a ponto de seu gênero também trocar? É, no mínimo, curioso.

A única coisa que me causa incômodo em toda essa história é pensar que sempre houve uma balança e harmonia entre o Doctor e sua Companion. Enquanto o Senhor do Tempo era um homem, e consequentemente, regido pelo privilégio de seu sexo, a companion era uma mulher, que historicamente é sempre vista como o sexo frágil, e, na série, por ser humana, era inferiorizada ainda mais (que o normal).

Em contra partida, Doctor Who sempre proporcionou momentos para criar um equilíbrio entre os dois, mostrando que não havia realmente uma diferença entre eles. As vezes, haviam situações em que o Doctor se sobressaia, mas também haviam outras onde era a Companion que levava a melhor e era a heroína.

Se agora temos uma Doctor, então, em prol de manter esse equilíbrio, será que podemos ter, depois de tanto tempo, uma companion homem? Particularmente, espero que sim. E mal vejo a hora do Especial de Natal, e, claro, da nova temporada.


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