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Relatos sombrios de experiências vazias

Em seu quarto álbum, The Weeknd mantêm sua identidade artística, enquanto explora sensações sombrias e construções nostálgicas dos anos 80.

Em seu quarto álbum, The Weeknd mantêm sua identidade artística, enquanto explora sensações sombrias e construções nostálgicas dos anos 80.


QQual foi a sensação quando você ouviu Can’t Feel My Face pela primeira vez? Foi com essa música que Abel Tesfaye, conhecido como The Weeknd se lançou de vez no cenário musical há quase cinco anos atrás, em julho de 2015. O cantor canadense que começou a fazer música no seu quarto, fora do alcance das grandes gravadoras, alcançou reconhecimento mundial e, agora, volta com um novo álbum de estúdio.

The Weeknd não esqueceu o sentimento explosivo do seu primeiro sucesso, mas prova que em After Hours, abriu espaço para expor sua personalidade característica, indo do pop ao R&B. Neste quarto disco da carreira, o segundo gênero tem mais espaço, em um formato alternativo, isto é, com influências do indie e do eletrônico, para tratar de experiências solitárias, momentos sem muito significado, que trazem a sua voz intimista e bem colocada, estimulando quem ouve a revisitar experiências internas.

DESEMPENHO
Impulsionado pelo álbum After Hours, The Weeknd ultrapassou a marca de 62 milhões de ouvintes mensais e se tornou o artista mais ouvido no Spotify, superando Justin Bieber, agora no segundo lugar com 61 milhões de ouvintes mensais. Ainda, na lista das músicas mais ouvidas no Spotify Global, todas as 14 faixas do álbum apareceram nos primeiros dias após o lançamento, a maioria no top 20. O #1 ficou com o hit Blinding Lights e o #2 com Alone Again, faixa que abre o álbum.

 

After Hours

Capa do álbum

Ao longo das 14 faixas, The Weeknd traz consigo a reflexão que por vezes se mostrou mais pop, como em Starboy – single do álbum de mesmo nome lançado em 2016 – que o projetou novamente aos olhos da indústria. No novo disco, o pico mais parecido com essas duas músicas citadas é atingido em Blinding Lights, provavelmente a mais enérgica do disco, ou então em Heartless.

Certamente, o álbum poderia ser parte da trilha sonora de Stranger Things por investir pesado em tendências dos anos 80 como na faixa Faith, apoiado na observação da realidade passada que domina todo o material. É como se o artista tivesse se inspirado no tom pesado do clipe de Thriller, de Michael Jackson, além de filmes de terror e ficção para compor e construir o novo álbum, desde a capa com tons frios e expressão sarcástica, até a estética sombria dos clipes.

Além disso, o vermelho parece anunciar a cor e o máximo de tons quentes que o artista vai chegar nessa nova era, nas luzes, figurinos dos clipes e apresentações até o momento, deixando o preto e as tonalidades escuras tomarem conta.

Uma prova da postura pensativa do cantor é a coletânea não conta com grandes parcerias como em seus últimos trabalhos, seja com Lana Del Rey, Daft Punk ou Kendrick Lamar, tomando si próprio como companhia em tempos de isolamento social e adaptação a novas realidades que fogem ao nosso controle. Ele mesmo participa das composições, incluindo nomes influentes como Kaan Gunesberk, Jason MontagneseAdam FeeneyMax Martin.

Nesse sentido, revela-se um ponto forte do lançamento que, em período de distanciamento, The Weeknd convida o olhar para si, na busca de reavaliar suas escolhas e experiências anteriores. Comportamento válido e mais, necessário para agora, em que temos que nos reinventar, seja nas relações afetivas ou de trabalho, e muitas vezes, se contentar com o contato virtual e as reações das redes sociais.

Em entrevistas para a revista CR MEN, The Weeknd tem declarado que After Hours foi feito num período em que ele preferiu ficar em casa:

“Não estou gostando de sair muito de casa. É uma dádiva e uma maldição porque me ajuda a ter atenção ao meu trabalho. Gosto de ser workaholic, acredito, ou só estou viciado nisso. Acho que me distrai da solidão”.

 

R&B SOLITÁRIO

Em After Hours o cantor assume o lugar de quem muito viveu e precisa compartilhar suas angústias e aprendizados. Enquanto Dua Lipa parece comandar e agitar a festa e pistas de dança com Future Nostalgia, o cantor canadense chega para embalar o fim da festa. E como nem só de alto astral vive o R&B e o pop, o sentimento de estar só que por vezes dá as caras no álbum é marcante, principalmente no universo dos gêneros nos últimos tempos.

“Não sei se consigo ficar sozinho novamente”, canta The Weeknd em Alone Again, primeira faixa de After Hours, evidenciando uma investida já vista em artistas como Demi Lovato e Selena Gomez, ex-namorada do cantor que provavelmente inspirou alguns dos versos aqui presentes.

Fato é que ele se apropria do tom honesto para reconhecer suas fragilidades aos fãs e recolher memórias de um relacionamento que parece não conseguir desapegar, isso tudo sem perder o estilo das batidas repetidas e graves consistentes, dando espaço para desfilar as habilidades do seu vocal, em especial seus falsetes marcantes ao longo da experiência sonora de 56 minutos, sem contar as canções Nothing Compares, Missed You e Final Lullaby presentes na versão deluxe do material.

Na segunda faixa, Too Late, o canadense assume erros e reconhece ser tarde demais para salvar o namoro. Na penúltima canção, a faixa-título, contudo, tenta uma reconciliação justificando que “desta vez, não vou lhe decepcionar”. Outro destaque é Scared to Live, que inclui um sample de Your Song, clássico de Elton John, base de um pedido a pessoa amada para não ter medo de viver novamente, enquanto se coloca como motivo pela qual a mesma esqueceu de amar.

Dessa forma, After Hours reflete uma fase sombria da vida do astro, ou seja, a ligação a uma antiga relação e o despreparo para se abrir a novas vivências. Assim, temas como hábitos noturnos aparecem no projeto, contribuindo para reforçar a indiferença com a realidade e a criação da própria que, por vezes, beira a insanidade.

SUCESSO
Com 444 mil unidades vendidas apenas nos sete primeiros dias depois do lançamento, The Weeknd conquistou a maior semana de consumo de 2020, até o momento. Com esse feito, o artista bateu um recorde pessoal, superando em número de vendas na primeira semana, o seu segundo disco de estúdio, Beauty Behind the Madness, divulgado em 2015. After Hours se tornou o quarto álbum consecutivo do cantor a estrear na posição mais alta da Billboard 200.

Em tempos de músicas comerciais, The Weeknd aposta, com sua elegância fria e cativante, em uma sonoridade sofisticada que reúne e combina sua identidade artística, mantendo a imersão no alternativo, com a falta de perspectiva que parece estar por trás dos versos. Com After Hours o artista comprova que, apesar de sombrio, o nosso fim de festa ou de algum momento marcante, pode ser mais reflexivo e construtivo que pensávamos.


PLAYLIST


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