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A Libertação d’A Voz da Geração

Christina Aguilera quebra o hiato de seis anos com o "Liberation", um álbum mais pessoal, retratando acontecimentos recentes de sua vida.

Christina Aguilera quebra o hiato de seis anos com o “Liberation”, um álbum mais pessoal, retratando acontecimentos recentes de sua vida.


EEm novembro de 2017, Christina Aguilera emergiu na mídia após adotar um novo visual, diferente de todos os outros até então. Em uma foto no Instagram, ela anunciava “coisas novas no horizonte”. Em uma camisa bastante explícita escrita “Chupa Meu Pau“, Christina deixa claro que nesta nova fase de sua vida e carreira, a cantora está oficialmente ligando o “foda-se” e finalmente se libertando das amarras das quais passou tantos anos presa.

O sucesso de Aguilera é fruto de uma relação com a Disney, quando, aos 13 anos, estrelou o reboot do programa infantil O Clube do Mickey Mouse, ao lado de outros nomes como Britney Spears e Justin Timberlake. Ela tinha 18 anos quando deu voz a versão single de Reflection, música da animação Mulan (1998). A música ajudou a dar notoriedade a sua carreira solo, que iniciaria em 1999 com a explosão do carro-chefe chiclete Genie in the Bottle. Assim, a cantora passou boa parte de sua vida na frente dos holofotes, enquanto sua carreira ia escalando e sua legião de fãs (e haters) aumentando.

Com mais de 226 prêmios ganhos, entre eles cinco Grammy Awards, Christina recebeu, em 2012, o título especial de “A Voz de Uma Geração“, no American Latino Media Arts Award (ALMA Awards). Prêmio este que ilustra perfeitamente o poder da voz da cantora, que dá substância a hits mundiais como a jazzy Ain’t No Other Man, a sexy Dirrty e a maravilhosa Say Something, da dupla A Great Big World. Christina não brinca em serviço e inspirou a nova geração de cantoras pop, como Demi Lovato, Ariana Grande e Bebe Rexha, ou até mesmo artistas como Lady Gaga.

 

Acelerando

O retorno de Christina Aguilera vinha carregado de expectativa. Seu último álbum, Lotus, foi lançado em 2012 e não vingou entre os críticos e muito menos entre os fãs, que vêem o disco como um dos mais fracos da cantora. Esse era o segundo projeto que não dava certo, após o Bionic, de 2010, receber críticas mistas e também não ter vingado nas vendas.

Conhecido como um “álbum além de sua época”, o disco ainda foi o centro de teorias de conspiração que colocavam Lady Gaga contra Aguilera, afirmando que a então artista do momento teria usado sua recente ganha influência para sabotar o álbum. A polêmica ganhou força e resistiu por vários anos, até o momento icônico que Christina e Gaga subiram ao palco juntas e terminaram a performance de mãos dadas, rasgando elogios uma a outra. Teria o suposto desafeto delas chegado ao fim?

Com dois álbuns com um lançamento ruim após dois álbuns que marcaram sua carreira (o Stripped, que ano passado completou 15 anos, e o Back to Basics), Christina Aguilera entrou em um hiatus. Assim, sua carreira se resumiu a apenas pequenas participações em faixas de outros artistas e um single avulso como homenagem as vítimas da boate Pulse, em Los Angeles.

Em 2018, tudo mudou. No começo do ano, uma faixa chamada Fall in Line vazou na internet. Junto a ela, notícias afirmavam que a faixa demo seria um dos singles do vindouro projeto, e que a sua versão finalizada contaria com uma grande cantora pop da atualidade. Foi o suficiente para ativar a internet a se preparar para o retorno de uma das maiores artistas da música.

Foi então que em 3 de maio Christina finalmente anunciou, oficialmente, o primeiro single do novo projeto. Accelerate chegou as plataformas digitais e streaming no mesmo dia, acompanhado de um vídeo. O carro-chefe trouxe a participação dos rappers Ty Dolla $ign e 2 Chainz, com produção de ninguém menos que Kanye West. Com uma rápida intro tribal, a música aposta no hip-hop, colocando Aguilera em um novo território, mais experimental, diferente do que ela já havia feito até então. A música dividiu ligeiramente os fãs, mas acabou sendo recebido por eles e pela crítica especializada, que chamava a faixa de “estranhamente fantástica” e um “corajoso retorno artístico“.

Imagem promocional de “Accelerate”

Não só o estilo musical de Christina Aguilera estava diferente, mas também a sua relação com os fãs. A cantora, que até então mantinha-se mais distante das redes sociais, passou a ser mais ativa, interagindo com seus seguidores, contando sobre o processo do álbum, seu significado, explicando cada uma das faixas, compartilhando fã-artes, vídeos por-trás-das-câmeras de ensaios fotográficos, music videos, eventos. Era uma nova Christina, que pela primeira vez mostrava suas sardas ao mundo na entrevista com a PAPER Magazine e vinha ainda mais angelical e direta em peças jornalísticas com a W Magazine e a Billboard.

A promoção do novo álbum continuou, com uma nova estratégia, adequando-se mais ao mercado fonográfico atual. Invés de trabalhar apenas com uma música, a cantora lançaria outras faixas do projeto até o lançamento do disco. Dito e feito. Twice chegou as plataformas na semana seguinte, acompanhado de um pequeno vídeo experimental. O grande trunfo, no entanto, veio apenas depois.

 

Fora da Linha

Fall in Line foi finalmente lançada em sua versão finalizada. E a grande artista pop que faria participação na música é ninguém menos que Demi Lovato, escolhida por Christina Aguilera especialmente pelo o poder de sua voz. Decisão esta que foi muito bem recebida pelo público e pela crítica, que celebravam o quando as duas vozes se encaixavam completamente e completavam uma a outra. Ambas as artistas possuem vozes poderosas e flexíveis, que deram à Fall in Line uma hino contemporâneo voltado, especialmente, à jovens garotas.

Qualquer um que conhece a carreira de Christina sabe que ela sempre foi muito vocal quando o feminismo. Se em Can’t Hold Us Down ela cantava “para todas as mulheres ao redor do mundo que já encontraram um homem que não respeita o seu valor“, em Fall in Line ela afirma que “toda a verdade dentro de uma garota é muito preciosa pra ser roubado dela“.

A faixa, no entanto, vai muito além do que sua primeira mensagem. Ela também é um manifesto de Aguilera para com a indústria musical, que durante anos, principalmente nos seus primeiros anos, esperava que ela seguisse a linha da garota comportada, sem opinião, submissa ao homem. É um grito em como a indústria é machista e abusiva, em como artistas femininas são sempre colocadas dentro de um molde e precisam fazer o que são mandadas, se quiserem ter algum tipo de sucesso, em como a sua inocência é roubada logo no início, em uma indústria que é famosa por vender fama em troca de sexo.

Há quem diga, ainda, que a música também é uma resposta à RCA, gravadora que assina a carreira de Christina Aguilera. Nos últimos anos, o selo vem mostrado descaso com a cantora e notícias afirmavam que eles não estavam muito felizes em apoia-la nesse novo projeto, tentando força-la a lançar um álbum mais genérico e que fosse vender muito. Mas depois de 20 anos, Christina não é mais, como ela mesma afirma, uma artista de vendas.

 

Procurando Maria

Liberation chegou nas lojas e serviços de streaming no dia 15 de junho, seis anos após seu último disco. Com Accelerate, Twice e Fall in Line apresentado, estava na hora de focar no álbum. A Libertação de Christina Aguilera está presente em cada uma das faixas, que juntas narram um pouco sobre como a cantora andou se sentindo nesses últimos anos desde o Lotus. É sobre se distanciar de qualquer coisa que não seja a sua verdade, sobre se soltar das amarras da indústria, sobre ser ela mesma e poder ser o que ela quiser, viver livre das expectativas dos outros. É sobre apreciar, de forma crua, a sua própria beleza.

É sobre esse novo mantra que Maria é a personagem central do álbum. Baseada em A Noviça Rebelde (1965), Aguilera quer achar a sua Maria interior. No filme, a personagem de Julie Andrews é uma freira que não sente pertencer completamente ao convento, mas que quer desesperadamente ter essa vocação. Para encontrar seu lugar, ela é mandada para ser a governanta das sete crianças da família Von Trapp, onde ela finalmente encontra o seu verdadeiro chamado.

Após os interludes Liberation e Searching for Maria, com samples da música Maria, da trilha sonora de Noviça, Christina chega na sua própria faixa, Maria, com produção de Kanye Westsamples de Maria (You Were the Only One), performada por Michael Jackson. Aqui, ela questiona onde está essa pessoa que ela quer tanto conhecer, porque ela não consegue enxergá-la. Christina Aguilera se queixa do custo de sua fama e de ter se permitido “seguir a linha”, que tudo isso foi caro e que ela já não se reconhece quando olha no espelho, por estar tão no fundo de sua própria vida e carreira.

Em Sick of Sittin’, produzida por Anderson .Paak, a cantora continua a analisar as decisões que tomou na vida, a quantidade de coisa que ela fez que hoje ela sente não ser mais ela. A faixa faz uma alusão direta ao seu tempo no The Voice, no qual Aguilera revelou recentemente ter sido excruciante, por ser um programa que não se importava com os artistas, mas apenas em ganhar fama e dinheiro. A cantora passava horas sentada, brincando de girar sua cadeira vermelha e aqui ela relembra o quanto ela se sentia escrava de tudo. Agora, ela está cansada de ficar sentada e aceitar qualquer coisa que caia no seu colo. Sua raiva e angustia é expressada de forma ainda mais clara com a vibe rock and roll da música, com as guitarras sampleadas de No Registration, guitarrista e compositor sueco Janne Schaffer.

Dreamers entra em ação, com garotas falando o que elas querem ser e ter quando crescer, como a Presidente ou apenas fazer suas vozes serem ouvidas. O interlude, que traz a breve participação de sua filha, Summer Rain, antecede Fall in Line, encaixando perfeitamente com a letra e ideia central do single. O álbum ainda faz outros questionamentos, como em Twice, onde Christina questiona o eu interior. Estamos apenas nos extremos? Só podemos ser Paraíso ou Inferno? Água ou Fogo? Puro ou Impuro?

Com uma boa dose de baladas e faixas sensuais, Liberation flui de forma natural entre alguns gêneros, como o reggae em Right Moves, o R&B de Pipe e o hip hop da já citada Accelerate, por exemplo. Christina Aguilera sabe aproveitar de sua poderosa voz para transitar organicamente em gêneros musicais diferentes do seu primário e também dar emoção a baladas poderosas e significativas como Masochist. Aguilera prova que o conceito de seu álbum não está tão deturpado, acompanhada de uma aclamação da crítica, que coloca o Liberation entre os melhores discos de sua carreira (se não o melhor), enquanto o agregador Metacritic registra uma das maiores Nota do Público de todos os tempos.

https://www.youtube.com/watch?v=3Q2j5ApzSqs&list=PLT3Y-E0TdXswIl68K4jQ5c3CDjYV8nk1F

Com um álbum tão focado em independência e encontrar sua própria voz, Christina Aguilera prova que ela não é mais, de fato, uma cantora que só se importa com vendas. Aguilera quer passar sua mensagem, usar sua plataforma para ser melhor e dar voz à injustiça. Não só isso, a cantora também exerce um papel pivô no mundo da música, por ser uma espécie de intermediária entre artistas, compositores e produtores pequenos e desconhecidos para com a indústria musical mainstream.

Em Liberation, Christina ajuda a apresentar os artistas Keida, XNDA, GoldLink e Shenseea para um público que, provavelmente, não iria conhecê-los de forma natural. E mesmo se unindo a poderosos nomes da indústria como Kanye West, ela também traz colaborações com Anderson .Paak, nomeado à Melhor Artista Novo no Grammy Awards de 2017, o britânico MNEK e até mesmo Julia Michaels, nomeada a Melhor Artista Novo no Grammy 2018.

Mesmo que não tão ligado com a música pop, a espera pelo novo álbum vale muito a pena. Christina Aguilera não tem medo de ousar, experimentar, sair do genérico e vender pouco, lançando um projeto nos seus próprios termos. Sua Libertação ajuda o público geral e os fãs a ter uma ideia melhor de seu atual momento, além de mostrar o que o horizonte pode estar preparando agora que a cantora já deixou claro que ela não pretende tirar férias tão longas e já está empolgada em fazer o sucessor do Liberation.


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