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Em certa medida Vitória (2020), curta de Ricardo Alves Jr, tem uma similaridade interessante com Arábia (2018). Ambos os filmes fazem retratos secos e de denúncia sobre as condições trabalhistas e o impacto do labor na população brasileira. Porém, enquanto o longa de Affonso Uchoa e João Dumans recorre a uma narrativa onírica que apresenta a tomada de consciência do protagonista, o curta de Alves Jr. foca em uma personagem que já está decidida pela ação.

O efeito dessa escolha é que Vitória tem em seus enxutos 12 minutos de duração um trabalho preciso de construção de um filme-denúncia pela via da relação entre mulher e máquina, indivíduo e coletivo e, sobretudo, por uma encenação que preza pelo impacto sensorial.

Há aqui um trabalho sonoro primoroso capaz de marcar a presença dos ruídos do maquinário pesado trabalhando mesmo quando vemos a protagonista fora do espaço de trabalho. Assim, Alves Jr. cria um efeito de onipresença da urgência e da necessidade do labor para Vitória (Rejane Faria) e todas as operárias da fábrica de tecidos que acompanhamos. É uma bela saída para demarcar também, mesmo que em poucos minutos, uma sensação de impotência ensurdecedora sobre as personagens que não tem suas reivindicações ouvidas –  um fato é assimilado a encenação por meio desse som impositivo sobre a rotina delas.

Neste sentido, Vitória é um filme de posição bem clara no retrato político seco e denunciador da rotina exaustiva, desgastante e do ambiente que suprime a voz dessas mulheres trabalhadoras. É daqui que surge o ruído – já que tanto falamos de som – presente no curta: o roteiro de Germano Melo opta pela fala, levando o posicionamento político para a via da verborragia do discurso sindicalista que já fica claro na própria organização delas como trabalhadoras.

As cenas em que elas conversam e se fazem entender, mesmo que em meio a tanto barulho, cumpre bem essa função de demonstrar como há um senso de coletividade e uma rede apoio sendo formada naquele ambiente opressor e ensurdecedor.

Dentro deste relato observador e ouvinte do trabalho maçante e incômodo em um ambiente que vai gradativamente se revelando impositivo, Vitória cresce quando deixa de lado a eloquência dos diálogos e encontra sua a força – tanto discursiva quanto fílmica – na dinâmica de quebra da atmosfera sonora agressiva por meio de um silêncio revelador.


MOSTRA TIRADENTES

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Isabela Oliveira

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