fbpx
"O Primeiro Homem" coloca Ryan Gosling no corpo de Neil Armstrong, numa narrativa que mostra o exaustivo processo para a primeira visita do homem à Lua.

“O Primeiro Homem” coloca Ryan Gosling no corpo de Neil Armstrong, numa narrativa que mostra o longo processo para a primeira visita do homem à Lua.


Praticamente todo grande diretor de cinema tem em sua filmografia um relato biográfico de uma figura pública importante ou a retratação de um relevante acontecimento histórico da humanidade. Em O Primeiro Homem, Damien Chazelle retorna a direção de um longa depois de impressionar o mundo com sua qualidade e maturidade enquanto cineasta, apesar de ainda muito jovem. Nesse caso, a idade do diretor torna-se ainda mais interessante para a relação com o filme, uma vez que Chazelle é de uma geração que cresceu com a chegada do homem na lua já sendo um fato.

Talvez seja, justamente, a curiosidade pessoal do diretor em conhecer como se deu todo o processo da Corrida Espacial, prerrogativa de onde parte as escolhas narrativas da produção, que tornam O Primeiro Homem cheio de personalidade e diferente de qualquer outro filme que tangencia o mesmo tema. Assim, a principal diferença deste longa para os outros é a escolha de um olhar mais seco, pouco patriota, sem os ufanismos militares e nacionalistas que Hollywood frequentemente adota. Chazelle e o roteirista Josh Singer optam por nos apresentar oito anos de uma trajetória pessoal de Neil Armstrong (Ryan Gosling), desde seu período de treinamento na NASA até a marcante chegada na Lua.

Não só a opção por focar no que envolve diretamente a “pessoa” Neil Armstrong, como sua relação familiar, a maçante rotina de treinamentos, protocolos e situações perigosas em que um aspirante a astronauta passava dentro daquele contexto, mas também a noção de trabalhar o protagonista como um homem comum e não o mito heroico que se tornou devido a conquista, tornam aquela história mais humana. Vemos um homem com dificuldade de convivência social, contido e que guarda para si os sentimentos mais profundos, além de enxergamos as consequências deste comportamento em seu núcleo familiar e na relação com sua esposa.

Toda a estrutura narrativa do longa é interessante por priorizar a construção do momento impactante que é a chegada do homem a lua, seja essa preparação os acontecimentos históricos ou as escolhas técnicas de Singer, Chazelle e pelo trabalho impecável de Justin Hurwitz na composição da trilha sonora, de Tom Cross na montagem do longa, de Linus Sandgren na fotografia e de todo o departamento de som. Hurwitz e Cross trazem ritmo ao filme, que não cai na armadilha de se tornar monótono ou de ser arrastado como a árdua missão de chegar a lua graças a sincronia entre uma trilha evocativa (bem trabalhada nos momentos em que se exige silêncio) e uma montagem cirúrgica para a cadencia narrativa. A cinematografia de Sandgren traz uma estética documental que agrega ainda mais à escolha do diretor de tratar dos fatos de maneira crua e realista, trabalhando com uma iluminação natural que, curiosamente, torna as cenas noturnas do longa de um apuro estético belíssimo.

A passagem de tempo dos oito anos apresentados ao espectador é muito orgânica, fluindo não só pelo trabalho do montador e do compositor já citados, mas muito também pelo trabalho impecável da equipe de direção de arte e do design de produção. Desde os cenários, figurinos e os mais variados objetos e aparelhos troncudos asseguram uma atmosfera sessentista bem construída, além de uma evidente passagem de tempo predominante nas transformações das instalações militares e na melhoria da precariedade das aeronaves em que os pilotos são constantemente inseridos.

Inclusive, a representação da claustrofobia incessante da cabine do astronauta é recriada perfeitamente devido a uma fotografia intimista, a um design de produção arrojado, de uma montagem eficaz e, principalmente, de uma edição e mixagem de sons capazes de transformarem aquele pequeno espaço em uma câmara de angustia. Uma das cenas mais impactantes, pelo menos no que tange à experiência cinematográfica, é justamente quando Armstrong e seu companheiro de jornada, Buzz Aldrin (Corey Stoll), pisam na Lua pela primeira vez, permitindo que a saída do módulo da aeronave para a imensidão silenciosa e bruta do espaço sideral seja ainda mais intensa pelo olhar das câmeras IMAX.

Para equilibrar o distanciamento e a abordagem mais crua da chegada ao satélite natural, o roteiro constrói uma estrutura emocional sólida para seus personagens, mas sem sentimentalismos debilóides ou exageros dramáticos. Isto transforma os conflitos do cotidiano em mais um cometimento da vida e, seguindo a proposta do diretor, mais uma pedra no árduo caminho que levou Armstrong ao espaço.

Ryan Gosling refaz a parceria de sucesso com Chazelle depois de La La Land para viver o protagonista com precisão, segurando as emoções e afirmando a inexpressividade do astronauta. Claire Foy traz muita personalidade a Janet, a esposa de Armstrong, com uma presença de tela impressionante e de uma intensidade no olhar que captura o espectador, servindo como o contraponto humano e o peso que traz a atenção de seu marido para o mundo que ele já conseguiu alcançar: seu núcleo familiar. São dois personagens diametralmente opostos, que assim como a Terra e a Lua, se distanciam e se alinham em ciclos diferentes.

Na imagem, Ryan Gosling e Claire Foy como Neil e Janet Armstrong

O resultado de O Primeiro Homem é um filme maduro e consciente de sua proposta, que em momento algum abre mão tanto do que quer falar quanto da maneira com que quer dizer. As escolhas estéticas e narrativas do diretor sustentam um longa equilibrado, enervante e envolvente, capaz de propor um olhar ao mesmo tempo intimista e distante da chegada do homem à Lua.


OSCAR 2019

Indicações: 4.

  • Melhor Mixagem de Som: Jon Taylor
  • Melhor Edição de Som: Lee Gilmore
  • Melhor Efeitos Visuais: Ian Hunter, J.D. Schwalm, Paul Lambert, Tristan Myles
  • Melhor Direção de Arte: Kathy Lucas, Nathan Crowley

Compartilhe

Twitter
Facebook
WhatsApp
Telegram
LinkedIn
Pocket
relacionados

outras matérias da revista

Música
Mike Faria

O retorno leve da grande artista que é Ariana

Vocais em destaque, batidas suaves e harmonias agradáveis: assim é composto o Sweetener, novo álbum de Ariana Grande. Vindo de uma investida sensual e provocante com Dangerous Woman, lançado em 2016, ela parece finalmente se render as suas preferências e emoções. Apostando em um ritmo delicado, a artista traz um disco mais doce, como sugere o próprio título do projeto (Adoçante, em português), em um repertório harmônico e diferente de seus trabalhos anteriores. A nova era, tanto em sua vida pessoal quanto em sua carreira, é marcada um pop sombrio, com detalhes instrumentais, possivelmente o resultado do atentado terrorista que

Leia a matéria »
Back To Top