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"It: Capítulo Dois" amarra as pontas soltas do seu antecessor, fugindo de clichês e mostrando o melhor do cinema de terror.

Parte final da adaptação talvez tenha sido a primeira traduzir tão bem a essência de Stephen King.


DDois anos após a estreia do primeiro capítulo, It chega ao seu final com uma adaptação sublime da obra de 1.100 páginas de Stephen King, lançado em 1986. A continuação se passa quase três décadas após a primeira parte, e o grupo encantador das crianças do Clube dos Perdedores cresceu e está em sua versão adulta.

Assim como Pennywise (Bill Skarsgard), que revive o mesmo ciclo a cada 27 anos, It: Capítulo Dois apresenta os perdedores caindo nos mesmos erros do passado. Bev (Jessica Chastain) está em um novo relacionamento abusivo, só que desta vez o problema é seu marido, e não seu pai. Eddie (James Ransone) encontrou em sua esposa uma figura tão sufocante quanto sua mãe, enquanto Ben (Jay Ryan) ainda sofre com o amor não correspondido e Richie (Bill Hader) continua usando o humor como máscara para esconder um segredo antigo. Por fim, Bill (James McAvoy) ainda precisa lidar com a culpa que carrega desde a morte de Georgie.

Tão perdidos e confusos quanto estavam no começo, os seis protagonistas precisam retornar a pequena cidade de Derry, nos Estados Unidos, em uma reunião forçada, após um chamado urgente de Mike (Isaiah Mustafa).

Pôster nacional

A cena inicial é, para mim, a melhor de It: Capítulo Dois. Vemos Pennywise em sua melhor forma, em uma cena tão triste quanto assustadora que traduz o sentimento que a obra literária gera. It se alimenta de pessoas com medo, e a cena mostra um casal gay sendo atacado por um grupo de homofóbicos – e, quando estão no auge do terror, o palhaço aparece com incontáveis balões que dominam a tela. O medo permeia os planos físicos e psicológicos de forma maestral, um resultado do talento do diretor Andy Muschietti.

Complementando a construção de terror, Bill Skarsgård dá um verdadeiro show de atuação na interpretação do palhaço. Com os olhos cruzados e o sorriso sádico, o ator se provou digno do papel e vai ser difícil esquecer seu rosto. Ele foi apenas uma das ótimas decisões de casting. Ao longo do filme, enquanto cada personagem precisa reviver seus medos e confrontar It, vemos como a escolha de atores foi acertada.

Eu, que nunca achei muita graça em Bill Hader, me senti extremamente cativada por sua performance como Richie. Vê-lo em conflito com suas dores e amores é tocante, e o ator consegue jogar luz no segredo da homessexualidade de Richie de uma forma que nem King conseguiu em seu livro, já que esse ponto é ambíguo na obra original. James Ransone também é uma surpresa maravilhosa no papel do hipocondríaco Eddie, e sua semelhança com a versão jovem do personagem, interpretada por Jack Dylan Grazer, é absurda.

Da esquerda pra direita: Bill Hader, Jessica Chastain, James McAvoy, James Ransone, Isaiah Mustafa e Jay Ryan

It: Capítulo Dois usa e abusa de flashbacks dos protagonistas ainda crianças para pintar um plano de fundo da história de cada uma, aprofundando em questões psicológicas que foram apenas pinceladas no Capítulo 1. Enquanto novos fatos são apresentados sobre cada personagem, entendemos melhor os medos mais profundos deles e sofremos quando Pennywise usa tudo isso a seu favor, com a atuação impecável de Skarsgård e uma pós-produção que brilha nos efeitos.

Uma crítica que precisa ser feita ao filme é que, para chegar ao resultado desejado, ele ficou gigante. A minutagem total é de 2 hora e 50 minutos e quase cansa o público. Talvez o único fator que tenha impedido esse cansaço seja o jogo de transição entre as crianças e os adultos.

Bill Skarsgård como o palhaço Pennywise

Quando eu terminei de ler It, não tive a sensação de ter lido um livro de terror – apesar de ter tido calafrios ao longo de vários capítulos. Ele era muito mais complexo do que isso. A obra fala muito mais sobre as dificuldades de lidarmos com nossos demônios internos do que com as maldades do mundo externo. Pennywise só é forte quando temos medo. Ele se alimenta de guerras que não conseguimos vencer e essa aura de bicho papão, que te conhece nos mais íntimos detalhes e sabe como brincar com a sua cabeça, assusta muito mais do que um palhaço com um simples balão vermelho.

Se Stephen King já foi acusado de se perder nos finais dos seus livros (como o personagem de Bill bem representa), It: Capítulo Dois recompensa esse histórico de forma magistral. Muschetii consegue adaptar a obra brilhantemente, com um filme complexo e bem produzido. A parte final amarra todas as pontas abertas da primeira, fugindo de todos os clichês e mostrando o que o gênero do terror tem de melhor para oferecer ao cinema.

Após anos de tortura interna e dois confrontos terríveis com o palhaço, o grupo finalmente se liberta das amarras do passado. Entretanto, como tudo na vida, a paz que o futuro guarda para parte dos protagonistas vem com um preço: lidar com a falta de Eddie e Stanley. O sentimento que as últimas cenas deixam é um tanto quanto agridoce: dor da perda se divide com o alívio de ter sobrevivido a tantos obstáculos. Talvez esse seja o objetivo de It: Capítulo Dois: retratar a vida como ela é (em uma forma mais extrapolada, é claro), mostrar que nenhuma vitória sem perdas e consequências, mas que tudo vale a pena quando se tem alguém do seu lado disposto a lutar com você.

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