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"Felicidade Por Um Fio" traz a história de Violet, uma mulher negra que passa por um processo de redescobrimento causando pela sua transição capilar.

“Felicidade Por Um Fio” traz a história de Violet, uma mulher negra que passa por um processo de redescobrimento causando pela sua transição capilar.


Nota da Colab: o texto contém spoilers. É importante também ressaltar que, em momento algum, me coloco no lugar de fala de uma mulher negra, pois essa não é minha vivência. O movimento negro deve ser protagonizado pelos negros. Meu papel aqui é analisar o filme como produto artístico, me relacionando com ele por ser uma mulher que passou pela transição capilar, assim como a protagonista.


À primeira vista, Violet Jones (Sanaa Lathan) parece ser uma mulher mega empoderada. Afinal, ela tem uma carreira de sucesso, é independente, tem sua própria casa e se acha maravilhosa – a vida “perfeita”, com direito a um namorado médico gostosão. Mas nunca julgue um livro pela capa! Violet se esforçava ao máximo para manter sua aparência impecável e um cabelo extremamente liso, tudo culpa de sua mãe que a criou exigindo que sempre se portasse dessa maneira.

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Tudo ia bem: o aniversário da garota seria naquela noite e sua assistente tinha garantido que Clint (Ricky Whittle), seu namorado, escolhesse tudo conforme o gosto dela. Violet tinha visto o que parecia ser uma caixinha com um anel de noivado no paletó dele e esperava um pedido de casamento durante a comemoração. As coisas começam a ir por água abaixo quando ela precisa ir a um salão para arrumar seu cabelo e sofre um corte químico (seu cabelo não suportou a química aplicada por engano e começa a cair). A solução é colocar uma peruca e problema resolvido!, mesmo que o sapato de salto estivesse machucando seu pé durante a festa.

Percebemos que Violet foi treinada, quase que num regime militar, para nunca exibir seu belo cabelo natural ou ficar levemente desarrumada. Uma cena que exemplifica isso é quando ela acorda de madrugada, antes de Clint para passar chapinha no cabelo e se maquiar de leve, retornando para a cama e fingindo dormir. O namorado a questiona por nunca estar menos do que perfeita.

Uma das cenas mais memoráveis do longa original da Netflix, Felicidade Por Um Fio, é um flashback em que a personagem é criança e está na piscina pública da cidade olhando todos seus amigos dentro d’água se divertindo. Ela não podia entrar pois revelaria seu cabelo natural crespo – e isso seria de extrema vergonha para a sua mãe (infelizmente). Violet não resiste e pula na piscina para brincar com um menino, mas quando seu cabelo começa a armar, todas as crianças zombam dela. A mãe, ao invés de consolá-la, a puxa pelo braço, com raiva, e a leva embora.

Mas agora chegou o tão esperado momento. Clint pega a caixinha e entrega a Violet. Dentro dela não tinha um anel de noivado e sim uma plaquinha em formato de osso, daquelas de colocar na coleira de cachorro. O presente da verdade era uma filhote de chiuaua. Violet não consegue esconder seu descontentamento e, ao chegar em casa, revela que esperava um pedido de casamento. O namorado diz, então, que nunca conseguiria se casar com ela por ela ser tão “perfeita”. Como ela não se permitia errar, ele sentia que não a conhecia. Mais uma vez Violet sente a necessidade de mudar seu cabelo, se arriscando no loiro. Seu cabelo representava grande parte de sua vida, e como ela mesma diz no filme, é um “segundo emprego”.

Na tentativa de esquecer Clint, ela decide ir à balada com as amigas. Depois de beber todas e deixar o local com um dos caras mais gatos da boate, ela percebe que não quer aquilo e decide ir embora. Ao chegar em casa, a protagonista decide, em momento de desespero e tristeza, se desfazer daquilo que trouxe lhe sofrimento todos esses anos: ela pega a máquina de barbear do ex namorado e raspa o cabelo. Em meio a lágrimas e risos, Violet vive uma epifania e se vê livre.

Ao acordar no outro dia, de ressaca, ela toma um susto ao se olhar no espelho, se sentindo feia e derrotada. Mas é aí temos uma das cenas mais lindas do filme, em que seu pai a encoraja a abraçar essa nova etapa. De início, Violet não se sente bem e esconde a careca com um lenço, mas ao encontrar um grupo de mulheres com câncer, ela se sente forte para assumir o novo visual.

É interessante observar como a personagem vai se redescobrindo durante sua transição capilar no restante da trama e começa a questionar seu próprio trabalho. Violet é uma publicitária muito bem sucedida do ramo da beleza, o que passa a incomodá-la, uma vez que todas as suas campanhas reforçavam continuamente os padrões estabelecidos pela sociedade do que é belo.

Buscando por mais uma mudança, Violet pede ao seu chefe um outro tipo de campanha, se colocando no desafio de desenvolver um comercial de cerveja. A mulher, então, consegue criar um comercial diferente do tradicional, empoderando as mulheres, mas acaba perdendo para dois homens que apresentam o comercial clichê de cerveja com uma mulher “gostosona”. Insatisfeita com o resultado, a jovem se demite, sabendo que aquele lugar já não a representa mais e que ela é capaz de ir além.

Felicidade Por Um Fio apresenta questões profundas como aceitação, auto-estima, negritude e discussão sobre padrões de beleza de uma forma leve. Pode parecer que é apenas mais um filme de comédia romântica de Sessão da Tarde, mas, com certeza, esse tipo de narrativa também é importante para gerar questionamentos naquelas pessoas mais fechadas ao diálogo.


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